Colóquio em Mairinque – Maioridade Social ou Penal?

Autores: Elzi Ferraz e Luiz Silvério Silva*

A Universidade Metodista de São Paulo, por meio da Cátedra Gestão de Cidades, em parceria com a Câmara Municipal de Mairinque – SP, via   Gabinete da Vereadora Ildéia, realizou no dia 24 de setembro de 2015 o Colóquio com o tema: “Maioridade: Social ou Penal?”. Teve como objetivo propiciar a reflexão sobre esta temática tão importante. A UMESP, cumpre, desta forma, sua função social de discutir temas de enorme interesse que afetam diretamente a vida das pessoas.

Estiveram presentes, além das vereadoras Ildéia e Selma, do representante das OAB e das Promotoras Legais Populares, o Prof. Dr. Luiz Silvério Silva e a Profa. Elzi Ferraz Silvério Silva. O evento contou ainda com a participação de artistas da cidade, com apresentações culturais de dança e do grupo de grafiteiros, realizando exposição dos trabalhos.

A Profa. Elzi iniciou a exposição, apresentando um breve histórico sobre os Direitos da Criança e do Adolescente, apontando as lutas e conquistas e os marcos legais, dando ênfase à legislação vigente no Brasil: O ECA – Estatuto da Criança e do Adolescentes, Lei 8069/90 e os avanços na questão do direito infanto-juvenil. Tratou do tema pertinente ao Colóquio, esclarecendo que já estão contempladas em Lei, as medidas socioeducativas (não punitivas) e que estas constituem instrumentos a serem aplicados aos adolescentes autores de ato infracional, previstas no Artigo 112 do ECA e sua aplicação deve ser feita em consonância com a Doutrina de Proteção Integral, estabelecida em lei.

O Prof. Dr. Luiz Silvério, que mediou o Colóquio, enfatizou a importância e o papel da Universidade nas discussões de questões tão relevantes para a sociedade come essa da maioridade. Fez uma breve análise da conjuntura nacional, sobre a atual situação no Congresso Nacional dessa proposta de alteração na legislação. Ponderou sobre os desdobramentos e perdas que seriam afetados com a redução da maioridade penal em relação aos direitos já garantidos na Constituição Federal. Fez uma comparação entre as práticas de outros países com o Brasil, com relação à essa questão. Após sua fala, foi aberto espaço para o debate, momento em que os participantes puderam fazer suas observações, perguntas e reflexões. Um grupo de adolescentes fizeram intervenções artísticas durante o Colóquio, apresentando uma performance de dança e elaborando grafites sobre o tema. Após os debates e encerramento do evento, os presentes foram até a praça, onde puderam apreciar o trabalho de grafite feito pelos adolescentes artistas: um belo mural sobre a temática.

A Cátedra Celso Daniel Gestão de Cidades prestou um serviço à comunidade de Mairinque com a realização desse Colóquio, proporcionando um momento de informação, reflexão e discussão sobre um tema delicado, relevante não só aos adolescentes como também para toda a sociedade.

*Coordenador da Cátedra Gestão de Cidades, mestre em Administração pela Universidade Metodista de São Paulo. Professor na Universidade Metodista de São Paulo na Área de Gestão e Negócios na Graduação e Pós-Graduação, presidente do Conselho de Administração do Banco do Povo Crédito Solidário e membro do Conselho de Cidades de São Bernardo do Campo.

Poesia Ocidental

Poesia incidental

Autoria: Baden Powell / Vinícius de Moraes

“O homem que diz “dou”

Não dá!

Porque quem dá mesmo

Não diz!

O homem que diz “vou”

Não vai!

Porque quando foi

Já não quis!

O homem que diz “sou”

Não é!

Porque quem é mesmo “é”

Não sou!

O homem que diz “tou”

Não tá

Porque ninguém tá

Quando quer…”

 

Autor: Marco Aurelio Bernardes*

Já andei muito, tive a oportunidade de trabalhar em mais de dez organizações, duas delas públicas (Sabesp e Prefeitura de São Paulo). Nelas lidei com pessoas arrogantes, exibidas, cheias de si e com o olhar voltado apenas para iguais, e não também para os diferentes e suas diferenças. Nunca esquecerei um presidente de uma entidade empresarial, que não subia no elevador com funcionários, exceto diretores ou presidentes de entidades empresariais, como ele próprio. Também muita gente boa, felizmente em muito maior número. Nelas, me despertava interesse, serem pelo bem da maioria, moderadas, corretas, reconhecidas e sobretudo simples, e olha que ser simples é um trabalhão sem fim. Um amigo François, me escreveu que a virtude, é o oposto do orgulho, que não gosta de se exibir, é adivinhada e que mesmo foge da admiração das multidões

No dia a dia, vive-se uma época difícil, em que o momento é o que importa pra muitos. Em função disso, as relações no trabalho exigem mais, emocionalmente, de cada funcionário, que o trabalho em si.

Na política, as verdades são cada vez mais aparentes e relativas e o improvável torna-se possível conforme o momento. Entidades empresariais beneficiadas por políticas econômicas em 2008/9, tem em suas lideranças, falantes de ocasião que fervilham e soltam verbos, diante das câmeras de tevês, para criticar abertamente representantes políticos a quem abraçaram em passado recente. Cadê a coerência, onde está o respeito pela história do outro? Está complexo viver. Muitas caras e bocas, pouca consistência, falas difusas sobre ética e de fato pouco compromisso com o respeito. Olha-se nos olhos e mente-se com facilidade.

Não, não se trata de um texto que remete à saudade e ele não vai ter uma frase que o encerre. Ele contém as minhas muitas limitações, sobretudo em entender o que se vive hoje em dia.

Mas se Clarice Lispector escreveu “sinto que sou mais completa quando não entendo”, sinto que estou em bom caminho, e em paz com a consciência de que entendo que não entendo.

*Economista, membro do Comitê Executivo da Cátedra Gestão de Cidades e coordenador da Especialização em Gestão de Cidades.

 

Gatos Pingados

Autor: Anderson Saber Campos*

Em julho deste ano, em Santo Antônio da Plata, no Paraná, após o bate-boca entre uma moradora e um vereador sobre o projeto de aumento de salário dos vereadores e prefeito, a população tomou as dores e pressionou a câmara a recuar e, em vez de aumentar, diminuíram o salário para os próximos eleitos.

Em agosto, moradores de cidade de Jacarezinho, também no Paraná, pressionaram os vereadores a rejeitarem o projeto que elevava o número de vereadores de nove para 13 e ainda pressionaram por uma redução de 30% nos salários da próxima legislatura. Este movimento ficou conhecido por “Gatos Pingados” após a declaração de um vereador que apenas um punhado de gatos pingados era contra o projeto.

Ainda em agosto, os vereadores de Cambira (Paraná) apresentaram um projeto para redução de salários também… e a população estava acompanhando bem de perto.

Vivemos na cidade, é neste espaço que estudamos, trabalhamos, nos locomovemos, buscamos atendimento de saúde, lazer e segurança. Nem tudo é responsabilidade da esfera municipal, mas é aqui que sentimos os impactos da administração pública de todos os níveis.

Não há mistério, quando o cidadão fiscaliza e pressiona seus representantes, em especial no município, estes tendem a se comportar como devem. Se não por consciência, pelo pragmatismo de precisar pedir votos na próxima eleição.

A Lei de Acesso à Informação aumentou o poder do cidadão para fiscalizar os três poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário) e de todas as esferas de governo (Municipal, Estadual e Federal). Sugiro uma visita ao site http://www.acessoainformacao.gov.br/menu-de-apoio/entenda-a-lai para entender como podemos usar a lei a nosso favor.

Quem sabe um movimento de baixo para cima que exija moralidade e cuidado com a coisa pública, começando nos municípios, estados e chegando até Brasília não faça a diferença? Não basta comparecer a cada eleição e votar, claro que é importante, mas o papel de fiscalização entre as eleições pode ser mais relevante como mostram as cidades do Paraná.

Imagine se houver um monte de “Gatos Pingados” espalhados pelo Brasil…

*Membro do Comitê Executivo da Cátedra Gestão de Cidades, possui graduação em Engenharia Elétrica pela Universidade Federal de Itajubá (1994), mestrado em Administração de Empresas pela Universidade Presbiteriana Mackenzie (2007) e doutorado em Administração de Empresas pela Universidade Presbiteriana Mackenzie (2011). Atualmente é professor da Universidade Metodista de São Paulo.

Ainda é tempo para recordar, reivindicar e recriar

Autora: Margarida Ribeiro*

“Recordar” em latim quer dizer “trazer de volta ao coração”. Neste mês (setembro) trazemos de volta ao coração muitas situações, como por exemplo, a chegada da primavera e outras situações agradáveis. No entanto, convidamos a trazer à nossa memória o que ocorreu no dia 3 de setembro de 1987, a chamada chacina de São Bernardo do Campo, em que seis crianças e adolescentes foram brutalmente assassinados. No dia 3 de setembro de 2015 nenhuma notícia foi publicada em relação a este acontecimento. Como está a nossa memória? Como estamos construindo a nossa história?

Atualmente há muitas discussões sobre maioridade penal, maioridade social, “muitas discussões…”. E no dia 13 de julho deste ano o Estatuto da Criança e do Adolescente completou 25 anos, até então muitas ações já foram realizadas; mas ainda há muito a ser feito no que diz respeito à implementação das políticas públicas nas instâncias municipais, estaduais e federal.

Ainda há crianças e adolescentes aguardando justiça e vida digna, enfrentando as mais diversas situações; como por exemplo: o menino sírio de três anos encontrado morto em uma praia, imagem esta que marcou o mundo e trouxe à memória de muita gente não somente a palavra, mas o despertamento para a ação solidária junto às pessoas que enfrentaram as agruras em meio às guerras, as atrocidades do cotidiano em busca de uma nova oportunidade para viver dignamente.

Setembro também é conhecido como o tempo em que florescem as flores, pois a primavera está chegando… Quiçá seja também um tempo de mudanças e renovo de esperança! Tempo de reivindicar das autoridades ações mais justas em relação à vida! Quiçá continuemos incansáveis na luta até que as crianças brinquem pelas praças em paz e com muita alegria (cf. Zacarias 8.5).

*Membro do Comitê Executivo da Cátedra Gestão de Cidades, doutora (2008) e Mestre (2003) em Ciências da Religião pela Universidade Metodista de São Paulo. Graduada em Teologia pela Faculdade de Teologia da Igreja Metodista (1989). Licenciatura plena em Filosofia pela Unijuí (1995).

Aqueles desafortunados

Aqueles desafortunados

Autor: João Gremmelmaier*

Não é novidade (discutido aqui mesmo neste blog, com muito mais propriedade aqui e aqui – e tem sido recorrente nos colóquios propostos pela Cátedra Celso Daniel) que há uma onda conservadora pautando as relações sociais no Brasil. Desde a redução da maioridade penal até a cor da camisa 3 do time de futebol da várzea, tudo é motivo para xingamentos, acusações, radicalismos.

Se a culpa disso é da mídia (e em parte é, por não informar), se a culpa é do PT (e em parte é, por desandar), e a culpa é dos políticos (e em parte é, por representarem seletivamente), se a culpa é das empresas privadas (e em parte é, corromperem) e se a culpa é do povo (e em parte é, por não escolherem) o que sobra? Somando todas as partes, todos têm culpa no cartório (eleitoral talvez?), mas nenhum tem mais culpa do que a política macroeconômica realizada, em que a equalização da vida social e econômica se faz urgente.

Que existe a necessidade de impostos, de gastos, de programas, de bolsas ou de demais mecanismos coletores de dinheiro da população é clara. Que são mal gerenciados, também o é. Que são injustos, menos.

A criação de um imposto regulatório sobre grandes (imensas) fortunas é urgente e para ontem. O alívio tributário para o povo e trabalhista para as empresas também. O caminho de retomada de crescimento no Brasil é longo, árduo, sofrido. Mas existe. É necessário? Não sei. Sim, sei, é, mas não a partir de propostas que já se mostraram saturadas, viciadas e, não menos relevante, prejudiciais no longo prazo.

Existem propostas em todos os campos econômicos e sociais. Reestruturar a tabela do IRPF e IRPJ não basta – a contribuição daquele que pode menos continuará, assim como o estrangulamento. É urgente, mais que urgente, urgentíssimo, para ontem, a taxação das grandes fortunas e dos grandes, ultra, mega, master-blasters ricos do Brasil.

De acordo com dois pesquisadores do IPEA (em matéria bloqueada pelo paywall do Valor Econômico), é possível entender que os brasileiros detentores de grandes fortnuas não tem interesse em realizar investimento em produção e tecnologia. Afinal, eles recolhem no máximo 6,5% de IR sobre suas aplicações. Enquanto que a massa trabalhadora se encaixa naquela faixa que vai até 27,5% de IR sobre o salário “efetivamente trabalhado”. Para mais debate, aqui e aqui.

Discussões sobre os rumos futuros do Brasil precisam tocar na ferida da grana. Não é possível viver em uma sociedade que sustente essa crueldade. Quem não pagarei a conta?

*Membro do Comitê Executivo da Cátedra Gestão de Cidades, Mestre em Administração (UMESP – Universidade Metodista de São Paulo), especialista em Educação (UMESP), graduado em Administração com ênfase em finanças e marketing (Centro Universitário Fundação Santo André) e professor em Educação a Distância na Universidade Metodista de São Paulo. Também é professor no curso de Especialização MPA – Master in Public Administration, da UMESP.

25 anos do ECA – Crianças acolhidas: entre os direitos e necessidades

Autoras: Carolina Tse e Hilda Avoglia*

Curso de Psicologia 

Cátedra Gestão de Cidades

Universidade Metodista de São Paulo

Falar sobre crianças é um assunto recorrente em nosso país. Importante relacionarmos esse tema ao fato de, neste ano, comemorarmos os 25 anos do Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, que regulamenta os direitos das crianças e adolescentes. De modo especial, traremos aqui das crianças em situação de acolhimento que, conforme preconiza o ECA, são protegidos pela lei regulamentada através do Conselho Nacional dos Direitos das Crianças e Adolescentes (CONANDA) de 1991, sendo previsto pelo ECA  como o principal órgão do sistema de garantia de seus direitos.

O ECA (1990) prevê que nenhuma criança ou adolescente será exposto a qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, bem como a lei garante o convívio e os cuidados da família de origem desde que cumpridos os seus direitos. Entretanto, pode ocorrer a intervenção dos chamados órgãos de proteção, como o Conselho Tutelar, Juizado da Infância e Juventude, Ministério Público, Programas de Assistência do Governo, entre outros. Identificamos aqui a garantida de proteção a qualquer criança ou adolescente que tenha seus direitos violados, afastando-os da família de origem quando necessário, encaminhando-os para um ambiente seguro, até que sua situação seja definida.

Assim sendo, destacamos que o ECA estabelece que diante das falhas na garantia dos direitos das crianças e dos adolescentes, esse segmento da população será encaminhado à abrigos como medida provisória e excepcional, em uma tentativa de readequação familiar ou ainda como último recurso, como uma forma de transição para sua colocação em família substituta (ECA, 1990).

Destacamos que o ECA estabelece a garantia, bem como regulamentações que preveem o que deve ser oferecido. Como garantia de convívio social, direito a educação, cuidados de higiene, alimentação, moradia, acesso à saúde, em uma tentativa de manter o indivíduo saudável, amparado socialmente. Mesmo assim, as regulamentações previstas se mostram insuficientes diante do desenvolvimento afetivo.

Baseados na perspectiva psicológica compreende-se que as crianças estão em fase de pleno desenvolvimento psíquico, como apontam os mais diversos psicanalistas da literatura especializada e, assim, necessitam de amparo e vínculos suficientes para assegurar esse processo de desenvolvimento que se estenderá o logo da vida.

Seja qual for o percurso que o acolhimento siga, estar no abrigo parece imprimir marcas no indivíduo, que potencialmente as carregará por toda vida. Embora os direitos busquem minimizar os traumas vivenciados, estes parecem ser insuficientes se comparados as implicações psicológicas decorrentes do afastamento familiar. Parte-se do pressuposto que, ao deixar a mãe e a família de origem para ser acolhida em uma instituição, o núcleo familiar da criança deixa de desempenhar seu papel, pois, abrigá-las parece protege-las da violência, dos maus tratos, da negligência. Contudo, permanece o questionamento sobre como a criança acolhida lida com essa transição do familiar para o institucional.

Estar em um abrigo é estar em um novo lugar, é conviver e dividir com outras crianças que enfrentam os mesmos sofrimentos, assistidas por cuidadoras que, por vezes, denotam despreparo para lidar com a complexidade que envolve esse papel social.

A existência do ECA, nesses últimos 25 anos, fatalmente registra as grandes transformações entre o que temos hoje e o que tínhamos há 25 anos atrás.  Da “ roda dos expostas” do século XVIII, na qual crianças eram abandonadas e criadas como um peso social aos direitos legalmente previstos, muitas idas e vindas se desenham, porém, garantir-lhes abrigo, não necessariamente lhes garante acolhimento real. Apesar de essencial para a própria sobrevivência da criança, muitas vezes observamos que enviá-las a instituições é uma medida que as protege, entretanto não abarca seu processo de desenvolvimento. Como concluem diversas pesquisas nesse tema, são reconhecidos os prejuízos psíquicos de crianças em situação de acolhimento.

O abrigo se faz necessário, pois, é inegável que em muitos casos verifica-se  dificuldades familiares para permanecer com a criança, porém havemos de considerar o papel dessa instituição na construção da subjetividade dessas crianças, uma vez que surge socialmente como uma possível substituição do lar.

São 25 anos do ECA como lei, de fato, marca o significativo avanço na manutenção dos direitos humanos diante da infância brasileira caracterizada por frequentes episódios  trágicos como infanticídios, escravatura, prostituição, ou seja, longe do ideal, ou mesmo do apenas suficiente para uma fase crucial na existência humana.

*Membro de Comitê Executivo da Cátedra Gestão de Cidades e possui mestrado em Psicologia da Saúde pela Universidade Metodista de São Paulo (1998) e doutorado em Psicologia Escolar e do Desenvolvimento Humano pela Universidade de São Paulo (2006). Atualmente é professora titular da Universidade Metodista de São Paulo.